segunda-feira, 1 de outubro de 2007


NYC 27/09/2007 (bêbada de tarde)

Peço desculpas se lhe dói ouvir isso. Mas a tua felicidade é uma afronta a minha dor.
Sim, claro! Faço tanta questão de viver. E essa felicidade superficial, quase cinematográfica, a vida linda e indolor, me tira do bom-humor raro com o qual me acordei essa manhã.
Reviro minhas dúvidas, escancaro minhas gavetas, coço minhas feridas. Mas sofrer é coisa de fracos, eu já sei!
É porque nos ensinam errado.
É porque só o viciado consegue largar as drogas. É só embriagado que choras dores empedradas. É só num insight, que é quase um transe, que algo é criado, que a arte toma vida. Toda grande criação vem depois do caos e se não há caos, sinto muito, meu bem, na tua vida litoranea não há grandeza, novidade. Nessa vida não há lição.

Um dia, falando de meu pai, minha mãe contou que durante a separação fez coisas que nunca se imaginou capaz de fazer. Ela disse que misturava whisky até no café e eu, boba, pequena, me assustei com aquilo, me decepcionei. Imaginá-la dentro do closet, chorando e tomando whisky, representava uma perda tão grande, uma dor tão vergonhosa da qual nem eu escapava. Aquilo parecia doer em mim.
Mas aquilo o quê? A purgação da dor? A válvula de escape que ela encontrara?
Eu estava errada. Era pequena. Me foi necessário tão menos do que um casamento de vinte anos pra ir muito além disso...
A idéia da força é uma merda de um conceito que a gente aprende. E ninguém tem que querer ser forte.
A vida é feita de perdas. E dores. Isso é o mais difícil de aprender.
É lindo dizer que errar é humano, ou que errar é viver. O difícil é realmente entender isso.

E, acredite, viver dói, amar dói. A novela não dói e quanto mais o nosso amor se parece com o cinema, mais medíocre ele é.
A vida é feita pra doer. E enfrentar essa dor toda (senti-la de verdade) é que é lindo. Muito mais lindo do que ser feliz e pleno sem nunca ter se virado do avesso pra escapar da insanidade.

Rainer Maria Rilke escreveu: “Que seria, com efeito, uma solidão que não tivesse grandeza?[...] Quase todos, em certas horas, gostariam de trocá-la por uma comunhão qualquer, por mais barata e banal que fosse; por uma aparência de acordo insignificante com quem quer que seja. Seu crescimento é doloroso como o de um menino, e triste como o começo das primaveras. Mas tudo isso não o deve desorientar. O que se torna preciso é, no entanto, isto: solidão, uma grande solidão interior. Entrar em si mesmo, não encontrar ninguém durante horas – eis o que se deve saber alcançar... Essa sua solidão há de dar-lhe, mesmo entre condições muito hostis, amparo e lar .”

Esse aprendizado é infinitamente lindo. Lindo do tamanho do mar.


Por Anita Petry

4 comentários:

Unknown disse...

Ta booom! Ta muito bom. Delicioso ler o seu blog. Voce eh bem isso. Misto de sentimentos, todos maravilhosos, deliciosos, daqueles que te enchem de tesao ao ler. Adoroooooooooo!!! Continue enchendo os nossos olhos e coracoes com palavras boas! Beijo

DAUGHTER NATURE disse...

Solidão, seja bem vinda! Entre. A casa é sua. Fique à vontade. Pode, pode fazer bagunça em mim, não tem problema. Mas, Solidão, em algum momento você terá que me deixar a sós...

Que estanho pensar que a Solidão me acompanha... Logo eu que sempre preferi ficar só...

Beijo da Eta

. disse...

Linda, só hoje entra no meu blog e lê tamanha sintonia.

A vida são trevas e céus (e quando nos berram "seja forte" estão brutalmente nos arrancando o direito de sofrer para então melhor alegrar).

Mediocridade sucks!

Renata Reps disse...

Nossa...
que texto mais lindo!
Realmente inspirador. Não deixem de escrever, daqui a pouco esse blog estará entre os top 10 do mundo! ;)

beijos da Reps, amiga da Cadija